Coordenadora do Legal Grounds Institute, Bianca Mollicone revela desafios éticos e legais da IA, propriedade intelectual e perspectivas de políticas públicas. Leia mais!
Recentemente, uma campanha publicitária feita pela Volkswagen usou recursos de Inteligência Artificial (IA) para produzir imagens da cultuada cantora Elis Regina.
No comercial, a artista, falecida em 1982, aparece dirigindo um carro da marca e cantando um de seus maiores sucessos ao lado de sua filha, Maria Rita.
Essa campanha acendeu um alerta no mercado publicitário e empresarial, de modo geral, que agora precisa lidar com questões relacionadas à propriedade intelectual e ética no uso de IA.
A advogada Bianca Mollicone, coordenadora do Legal Grounds Institute, conversou conosco sobre esse tema. Ela nos apresentou o contexto geral, desafios e tendências da relação entre IA, propriedade intelectual e ética. Acompanhe!
Propriedade intelectual no contexto da Inteligência Artificial (IA): desafios fascinantes na nova economia
A propriedade intelectual (PI), que abrange a propriedade industrial, o direito autoral e os direitos sui generis, é um dos ramos do Direito que tem enfrentado os desafios mais fascinantes na nova economia, em especial frente à IA.
Segundo Mollicone: “Sistemas de inteligência artificial generativa, como o ChatGPT e o Midjourney, que geram imagens a partir de descrições em linguagem natural, os chamados prompts, vêm ganhando notoriedade e provocando muito debate quanto à autoria das criações.”
A discussão sobre autoria no contexto da IA assume diferentes formas. Na propriedade industrial, por exemplo, as leis atuais não permitem que a inteligência artificial seja indicada como inventora em um pedido de patente.
Nesse sentido, Mollicone destaca que “é necessária a elaboração de legislação específica para disciplinar a inventividade desenvolvida por sistemas de IA.”
Além disso, a utilização de obras protegidas por direito autoral para treinamento de IA também gera polêmicas. Mollicone observa que “a relação entre IA e PI ocupa um lugar central nas discussões sobre regulação de novas tecnologias no mundo.”
O avanço da inteligência artificial está desafiando as estruturas legais existentes e exigindo uma reavaliação constante das políticas de propriedade intelectual.
Desafios éticos no desenvolvimento e uso de IA
Os desafios éticos no desenvolvimento e uso da inteligência artificial são amplamente discutidos em todo o mundo.
Como observa Mollicone: “A criação de obras por IA traz novamente à discussão a alegada figura monolítica que o autor ocupa na lei de direitos autorais.”
A capacidade das IA, como o Midjourney e DALL-E, de criar arte rapidamente com apenas um prompt de texto é vista como uma ameaça para artistas.
Além disso, a arte feita por criadores humanos muitas vezes é usada sem permissão ou pagamento para treinar modelos de IA. Isso levanta preocupações sobre direitos autorais e propriedade intelectual.
De acordo com Mollicone, alguns argumentam que a IA não viola direitos autorais, pois cada obra de IA é única. Entretanto, outros acreditam que isso pode criar problemas relacionados à proteção de dados e privacidade.
A regulação dessas questões está em andamento, com casos levados aos tribunais buscando definir os limites do que é considerado um trabalho derivado sob a ótica da propriedade intelectual. O conceito de uso transformativo, estabelecido em casos anteriores, pode ser aplicado as situações envolvendo IA.
Mollicone citou como exemplo o caso usando a imagem da cantora Elis Regina. O comercial motivou propostas de legislação, como o Projeto de Lei n.º 3592 de 2023, que estabelece diretrizes para o uso de imagens e áudios de pessoas falecidas por meio de IA.
Interseção entre ética e propriedade intelectual em sistemas autônomos e de autoaprendizagem: como lidar?
Em nossa conversa, Mollicone mencionou os movimentos recentes no setor de mídia: “O New York Times proibiu o uso de seus conteúdos para treinar IA, enquanto a Associated Press fez acordos de licenciamento.”
Além disso, a advogada destacou a iniciativa da News Media Alliance: “Eles estabeleceram princípios para proteger a propriedade intelectual dos editores.”
Na opinião da coordenadora do Legal Grounds Institute: “Em um cenário legal em evolução, a falta de legislação clara exige cautela”.
O equilíbrio entre inovação e proteção de direitos autorais é um desafio contínuo nesta área. Então, é preciso tomar cuidado ao dar cada passo.
Tendências e perspectivas de políticas públicas relacionadas à ética e à propriedade intelectual na IA
No entendimento de Mollicone, os governos buscam estratégias nacionais para impulsionar a IA, mas enfrentam um dilema: “A regulação excessiva pode inibir a inovação, enquanto a falta de regulamentação pode não prevenir os danos do uso indevido da IA.”
Na União Europeia, o AI Act, que aborda sistemas generativos de IA, enfatiza transparência e proteção de direitos autorais usados no treinamento.
Já nos EUA, o Comitê Jurídico do Senado realizou audiências sobre IA generativa e propriedade intelectual, incluindo o debate sobre consentimento para uso de dados e obras.
Mollicone destaca a tendência global: “Há uma negociação crescente de permissão entre empresas de IA e artistas, mas leis futuras precisam equilibrar inovação e direitos de propriedade intelectual.”
A especialista também comentou uma declaração da cantora Madonna, que recentemente anunciou que não deseja que sejam utilizados hologramas com a sua imagem após a sua morte.
“Certamente teremos cada vez mais uma tendência a deixarmos testamentos digitais e discussões quanto à amplitude da autorização que poderá ser dada pelos herdeiros, na ausência de uma vontade manifestada pelo falecido em vida”, opina Mollicone.
A propriedade intelectual das obras criadas por IA requer atualizações nas leis para abranger essa nova forma de criação. O desafio é encontrar um equilíbrio adequado entre regulamentação e inovação.
Fonte: Redação Futurecom Digital